No Brasil, 60% das pessoas já sofreram vazamento de dados ou conhecem alguém que passou por isso. E que 81% afirmam ter perdido o controle de como os dados pessoais são usados (The Harris Poll/IBM). O Brasil é o quinto país de onde mais se originam ataques na web (Akami). Em um mundo hiperconectado, produzimos dados constantemente.
Além das fichas cadastrais que já deixamos em incontáveis lojas, farmácias, clínicas, serviços públicos. O Brasil ainda não tem regras claras sobre o tratamento dessas informações. A Lei Geral de Proteção de Dados, que entra em vigor em agosto deste ano, estabelece regras de privacidade e segurança. É um dos grandes desafios hoje das empresas, de todos os tipos e tamanhos, e também de todos os órgãos públicos.
O que muda?
As empresas terão que criar um novo cargo, o DPO, Data Protecion Officer, profissional responsável pelos dados. Os processos terão que ser transparentes. O funcionário terá o direito de saber, por exemplo, quantas pessoas veem a sua folha de pagamento — e por quê.
Os clientes terão o direito de entrar em contato com qualquer empresa ou órgão público e perguntar que dados detêm, que uso fazem e quem os acessa. Se o usuário quiser apagar algum dado ou torná-lo anônimo, também poderá pedir. Além disso, será obrigatório criptografar os dados armazenados para que, na ocorrência de um vazamento, não seja possível lê-los. Quem não cumprir as regras está sujeito a multas que podem chegar a 2% do faturamento, limitadas a R$ 50 milhões.
“Existe uma série de dificuldades das empresas para se adequarem à LGPD. Não existe uma cultura da privacidade no Brasil, as empresas não tinham a ideia de que precisavam se preocupar com os dados”, analisa Renato Leite Monteiro, Fundador do Data Privacy Brasil. “O conceito de dado que a lei estabelece é muito mais amplo e todas as interações que as empresas têm com as pessoas precisam se adequar”.
Monteiro destaca que há 137 países com leis já implementadas sobre tratamento de dados. A União Europeia tem o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD) em vigor desde 2018. Já se vê por lá a demanda de clientes querendo saber junto às empresas quais dados elas detêm. E há negócios optando por pedir menos dados, para evitar dor de cabeça.
Segundo a advogada e doutoranda em segurança de dados pela UFRJ, Marília Kairuz Baracat, a adequação é constante, ninguém estará completamente pronto. Quando falamos em tecnologia, sabemos que as mudanças são aceleradas. Sistemas diferentes, dados crescentes, crimes novos, desafios e aprendizados constantes.
Mas não há por que demonizar o uso dos nossos dados. É a partir deles que um cliente fica satisfeito ao receber indicações de produtos que o interessam ou descontos nas compras. Ou que um paciente consegue mais agilidade no atendimento de saúde. O sinal vermelho deve estar no cuidado com esses dados, para haver a certeza de que não serão utilizados em práticas condenáveis de competitividade entre marcas ou como banco de perfis para disseminar fake news.
Como fiscalizar?
Nenhuma empresa ou governo vai querer se arriscar e deixar dados de clientes e eleitores à mercê de violações. O que as marcas e os políticos fazem com os dados está virando fator de confiança e, por isso, a credibilidade vai se tornar um diferencial, um novo atrativo das marcas. Mas haverá fiscalização, com a Autoridade Nacional de Proteção de Dados, subordinada à Presidência da República. Especialistas defendiam que fosse uma autarquia independente.
A previsão é que o Brasil seja exemplo para os vizinhos. “O espírito da lei brasileira deverá ser replicado, com adaptações, nos demais países associados ao Mercosul”, diz Baracat. Acima de tudo, quem está debruçado sobre o assunto destaca que a sociedade precisa saber dos seus direitos. Os brasileiros são early adopters para novidades.
Empresas de tecnologia desempenham muito bem por aqui. Mas, de uma forma geral, o amadurecimento como “cidadãos na web” demora. Há dois anos, futuristas e grandes nomes da tecnologia falaram e o mundo assinou embaixo: “dados são o novo petróleo”. Portanto, cuide bem dos seus barris.
Fonte: G1 Notícias
30 de janeiro de 2020